"... dou conta (...) que não podemos vencer esta batalha para salvar espécies e ambientes sem criarmos um laço afetivo com a natureza, pois não lutaremos por salvar aquilo que não amamos (mas só apreciamos de um modo abstrato)"

Stephen Jay Gould, 1993



Tempo de estudar as plantas

 Com a primavera, os campos atravessados pela Trilha da Serra de Canelas enchem-se de cor. Uma enorme variedade de flores rapidamente despertou a atenção e o interesse dos jovens investigadores para o mundo das plantas. Chegou o momento de nos centrarmos na biodiversidade vegetal.

Dedaleira (Digitalis purpurea). Planta venenosa da qual se extrai a digitalina, substância utilizada no tratamento de doenças cardíacas.

Urtiga-morta (Lamium maculatum). O nome vulgar realça a semelhança da folha desta espécie com a da urtiga não sendo, contudo, urticante como a urtiga, daí o termo "morta".

O trabalho de identificação das plantas foi, como habitualmente, realizado a partir de guias de campo que as organizam pela cor das suas flores: plantas com flores brancas, depois amarelas, azuis, roxas...

Esta forma de pesquisa facilita imenso o trabalho de identificação das espécies a pessoas não especialistas na área da botânica. A identificação das plantas foi feita em alguns casos somente até à família ou género, uma vez que a identificação até à espécie por vezes exige, não só conhecimentos não adquiridos pelos elementos do clube, como a utilização de chaves dicotómicas complexas e fastidiosas.

Identificação de uma planta a partir de um guia de campo. Este trabalho exige uma atenta observação dos pormenores: número de pétalas, de estames e carpelos, forma das folhas,... 

A identificação de plantas é sempre um trabalho realizado em pares ou em grupo. Os elementos envolvidos tentam encontrar uma  possível correspondência com as ilustrações do guia de campo. Posteriormente o seu palpite é ou não confirmado, salientando-se, em caso de erro, algum pormenor que não foi tido em conta. 

Muitas vezes a identificação realiza-se apenas até à família ou ao género. É o caso da planta que surge na imagem: pertence à família Geraniaceae.

Depois de identificada, uma pequena porção da planta é colocada dentro dos cadernos de campo para secar e ficar prensada. Posteriormente é colada. Neste caso, trata-se da espécie vulgarmente conhecida por morrião (Anagallis arvensis).

Passagem pela "Viela do Curro". É enorme a biodiversidade vegetal que cobre as paredes de pedra.

Serra Mágica

A Trilha de Interpretação da Natureza da Serra de Canelas, projeto iniciado pelo professor Alexandre Silva e seus alunos no início dos anos 80, é o espaço onde todo o trabalho de campo é desenvolvido pelo Clube de Ciências da Natureza. A sua criação veio chamar a atenção pública para a importância da preservação deste espaço verde no conselho de gaia. Entretanto, a situação atual da Serra de Canelas não é das melhores: há muito lixo espalhado e as espécies exóticas invasoras ocupam cada vez mais território. No sentido de alertar para todos estes problemas nasceu o projeto "Serra Mágica". No dia 13 de março o professor Luís Baião, do projeto "Sim, Somos Capazes", convidou-nos para a atividade "Pintura de totens Serra Mágica" para espalhar posteriormente pela Serra em substituição do lixo. É claro que não podíamos recusar!

Pintura das peças de madeira usadas para a construção dos totens (I).

Pintura das peças de madeira usadas para a construção dos totens (II).

Pintura das peças de madeira usadas para a construção dos totens (III).

Visualização dos totens entretanto colocados no percurso.

Elementos do clube tentam reconhecer as peças pintadas por eles próprios.


Tempo de regressar à escola..

Depois de várias saídas de campo chegou o momento de ficar na escola para aprofundar conhecimentos e registar tudo o que foi observado nos cadernos de campo. Este trabalho decorre sempre em equipa e inclui partilha de materiais e de informações que são encontradas nos diversos guias de campo de identificação de espécies que estão ao dispor dos alunos.

Consulta de um guia de campo de aves para obtenção de informações sobre a biologia dda águia-de-asa-redonda (Buteo buteo).

Recorte de uma imagem para ser posteriormente colada no caderno de campo.



Colocação da cola na estampa recortada.

Fase de colagem da estampa no caderno de campo. Posteriormente serão adicionadas informações sobre a biologia da espécie, neste caso a felosinha (Phylloscopus collybita).

Partilha de informações com os outros elementos da equipa.

Equipa do clube em pleno trabalho. Nesta sessão faltou um elemento.
 


O prazer de descobrir a natureza...

Ir para o campo e desenvolver trabalhos de pesquisa é também usufruir da natureza e partilhar essa sensação de bem-estar com os amigos. São vivências que contribuem fortemente para o desenvolvimento de laços afetivos relativamente ao mundo natural e... QUEM AMA, CUIDA!


Observação de invertebrados junto ao solo. Se prestarmos atenção aos pequenos detalhes, num qualquer espaço natural, é todo um mundo novo que descobrimos.

Lesma-preta (Arion ater). Trata-se de uma espécie que facilmente é observada pelas suas grandes dimensões e pela sua coloração negra. Em Portugal continental é muito comum no norte e centro, sendo mais rara a sul. 

Escaravelhos em fase de acasalamento (reprodução sexuada e fecundação interna).

Observação de um bugalho. Os bugalhos formam-se como resposta à picada de insetos que colocam o seu ovo no centro. Os bugalhos servem assim de proteção e alimento à larva que se encontra no interior. Quando atingem a idade adulta, os insetos fazem um furo e saem para o exterior. No bugalho observado é visível o furo realizado pelo inseto.

Exploração da região abrangida pela Trilha da Serra de Canelas.


Identificação de uma folha de loureiro (Laurus nobilis) pelo seu aroma. O loureiro é uma espécie nativa de Portugal presente em muitas partes do país.

Observação e registo fotográfico de uma castanha ainda dentro do ouriço.

Gafanhoto-do-egito (Anacridium aegyptium). Os indivíduos são solitários, alimentando-se essencialmente de folhas de árvores e arbustos, não sendo assim um risco para as colheitas.



Observação atenta do animal que está a ser manipulado de uma forma cuidadosa (pela ponta das asas) por um dos elementos do clube para não lhe causar qualquer dano.

Observação de um hemíptero, vulgarmente conhecido por percevejo da espécie Syromastus rhombeus. Estes insetos são caracterizados por ter armadura bocal picadora-sugadora (a boca está transformada num bico aguçado que é utilizado para sugar seiva de plantas). 



Observação e registo fotográfico de uma toca de mamífero (I).

Observação e registo fotográfico de uma toca de mamífero (II).

De regresso à escola após mais uma aventura no campo.




Milhafre-preto

 Ao fim de tantos anos de trabalho do clube começa a ser difícil identificar novas espécies de aves na região da Trilha de Interpretação da Natureza da Serra de Canelas. No entanto, este ano fomos brindados com o aparecimento uma nunca antes vista: o milhafre-preto (Milvus migrans), provavelmente em passagem durante os seus movimentos migratórios. Observamos um exemplar no dia 22 de novembro.


O milhafre-preto é uma ave de rapina de tamanho médio, que se caracteriza pela plumagem castanha e pela sua cauda bifurcada. É uma espécie migradora, que está presente no território português desde a inícios de fevereiro a finais de novembro. O seu Inverno é passado em África, a sul do deserto do Saara. 

Milhafre-preto (Milvus migrans) observado em 22/11/24. Esta é uma espécie migradora visitante de verão (presente em Portugal de março a finais de novembro).


A observação de aves de rapina desperta sempre um especial fascínio!

Partilha de informação entre os elementos do clube num momento de atualização dos cadernos de campo.

Consulta de um guia de campo para recolha de informações sobre a espécie.

Registo das informações no caderno de campo.

Bilhete de identidade:

Nome vulgar: Milhafre-preto.

Nome científico: Milvus migrans

Filo: cordados

Classe: aves

Habitat: campos, pastagens, junto a rios e lagos, junto a povoações e a estradas onde recolhe os restos de animais vítimas de atropelamento.

Comprimento: 55 cm.

Dimorfimo sexual: pouco evidente, machos em geral ligeiramente menores do que as fêmeas.

Alimentação: Pequenos mamíferos e anfíbios, peixes, animais mortos, restos de alimentos que procura em lixeiras (espécie oportunista).

Tipo de ocorrência: raro.

Saídas de campo nos meses de inverno...

 Durante os meses de outono e inverno, e mesmo nos inícios da primavera, quando muitos animais se encontram a hibernar e há muito poucas flores nos campos, as aves dominam a nossa atenção. Outros grupos de animais e as plantas, cujas flores são essenciais no processo de identificação, serão objeto de mais atenção nos próximos tempos...

Nos meses de inverno a nossa atenção centrou-se principalmente no estudo das aves.

A localização das aves deve ser sempre realizada sem a intervenção dos binóculos. A sua utilização posterior permite uma observação mais cuidada que é fundamental na identificação das espécies. Somente através dos binóculos conseguimos aperceber-nos de toda a beleza e singularidade destes animais. 

A observação de aves desperta sempre enorme interesse nos elementos do clube!

Ave encontrada morta no percurso da trilha no dia 13/12/23. Trata-se de um melro-preto (Turdus merula) fêmea. Nesta espécie há dimorfismo sexual, o macho e a fêmea distinguem-se facilmente pelo seu aspeto. O macho é preto e tem o bico amarelo alaranjado, a fêmea é mais acastanhada e tem o bico escuro. Depois de observada pelos elementos da equipa, a ave foi devidamente registada em fotografia com ajuda dos telemóveis.

Lugre (Spinus spinus) observado em 17/1/23. O lugre é uma espécie migradora invernante (vem passar os meses de inverno a Portugal).

Durante este período foram observadas e identificadas as seguintes espécies:

- Águia-de-asa-redonda (Buteo buteo)

- Alvéola-branca (Motacilla alba)

- Bico-de lacre (Estrilda astrild)

- Cartaxo-comum (Saxicola rubicola)

- Chapim-carvoeiro (Periparus ater)

- Chapim-rabilongo (Aegithalos caudatus)

- Chapim-real (Parus major)

- Felosinha (Phylloscopus collybita)

- Fuinha-dos-juncos (Cisticola juncidis)

- Gaio (Garrulus glandarius)

- Gaivota-de-asa-escura (Larus fuscus)

- Lugre (Spinus spinus)

- Melro-preto (Turdus merula)

- Milhafre-preto (Milvus migrans)

- Pardal-comum (Passer domesticus)

- Pega-rabuda (Pica pica)

- Peneireiro-vulgar (Falco tinnunculus)

- Pisco-de-peito-ruivo (Erithacus rubecula)

- Pombo-torcaz (Columba palumbus)

- Rola-turca (Streptopelia decaocto)

- Serzino (Serinus serinus)


Primeiras sessões...

 As primeiras sessões realizaram-se na escola, no início, e depois no campo. O encontro na escola serviu para explicar aos elementos das várias equipas alguns aspetos importantes sobre o clube como por exemplo metodologias de trabalho utilizadas, apresentação dos guias de campo e dos cadernos de campo. Uma vez concluída esta introdução ao clube partimos para o campo para iniciar a aprendizagem da utilização dos binóculos. Esta fase decorreu no recreio da escola, para duas das equipas, porque o tempo esteve muito instável no mês de novembro.

Uma das oculares dos binóculos é móvel. Ao rodá-la, conseguimos compensar algum diferencial de visão que possa existir entre os dois olhos. Antes de iniciarmos as observações devemos sempre acertar esta compensação de acordo com as nossas características. 

O parafuso superior permite focar a imagem (torná-la nítida). Os nossos dedos devem estar constantemente ocupados em rodar este parafuso de forma a conseguirmos realizar boas observações. 


Depois de observarem objetos estáticos a diferentes distâncias, os elementos do clube iniciaram o treino de observação de aves, alvos móveis e de pequena dimensão que exigem alguma destreza e concentração.

O tempo instável do mês de novembro não possibilitou a ida de duas das equipas para o campo, durante esta fase de aprendizagem da utilização de binóculos.

Algumas alvéolas-brancas (Motacilla alba) que procuravam alimento no recinto escolar exterior acabaram por ajudar nesta fase de aprendizagem.

Edição de 2023/24

Mais um ano, novas oportunidades para um conjunto de jovens exploradores experimentarem a sensação de construir conhecimentos sobre a natureza enquanto a vivem por dentro. O clube de ciências é um mundo de aventuras!



Dos trinta e seis candidatos ao clube, vinte e um foram selecionados mediante a apresentação de um trabalho. Eis um exemplo:
Exemplo de trabalho selecionado.

Os alunos selecionados, pertencentes a cinco turmas, foram divididos, como vem sendo habitual, em três equipas de sete elementos. As sessões do clube envolvem somente com uma equipa de cada vez. As equipas vão alternando ao longo do ano.