"... dou conta (...) que não podemos vencer esta batalha para salvar espécies e ambientes sem criarmos um laço afetivo com a natureza, pois não lutaremos por salvar aquilo que não amamos (mas só apreciamos de um modo abstrato)"

Stephen Jay Gould, 1993



Visita à "Casa Assombrada"

Uma das saídas que mais sucesso faz nas equipas do Clube de Ciências é a visita a uma antiga quinta com uma casa senhorial construída no séc XIX e que hoje se encontra em ruínas. No percurso para a quinta os elementos do clube tiveram a oportunidade de observar um sem número de insetos, aranhas e belas plantas espontâneas. Uma das equipas teve ainda a sorte de observar um lagarto-de-água (Lacerta schreiberi) que infelizmente não se deixou capturar.

Observação de insetos polinizadores sobre plantas.
Pela primeira vez observámos plantas em flor do género Dianthus na região da Trilha.


O acesso à antiga quinta fez-se através de um espaço aberto num muro que ruiu. A quinta ocupava outrora uma vasta região. Hoje, a vegetação selvagem tomou conta do espaço embora ainda se encontrem, aqui e ali, plantas que faziam parte dos antigos jardins: várias camélias, glicínias, roseiras loureiros, faias e outras.

Acesso à quinta.
Dentro da quinta os caminhos estão praticamente fechados por vegetação densa...
... e os problemas com as silvas são frequentes!


Este espaço, há muito abandonado, é agora "propriedade" de muitos animais. Observámos penas de uma pomba possivelmente capturada por uma ave de rapina, várias pinhas roídas por esquilos (Sciurus vulgaris), gaios (Garrulus glandarius), pegas-rabudas (Pica pica) e, numa das visitas, encontrámos um pachorrento sapo-comum (Bufo bufo).

Pinha roída por esquilo.


A casa é enorme. No seu interior cresceram árvores que têm já tamanho adulto. São tantos os compartimentos  que nem sequer se consegue ter uma ideia clara acerca da sua estrutura original. Próximo da casa ainda se encontram vestígios de lagos, esculturas caídas e belíssimos azulejos da época.
Vistas exteriores da casa (I).
Vistas exteriores da casa (II).
Entrada principal.
Escultura que servia de chafariz num lago.
Restos de um banco de jardim (?) revestido de azulejos.


Enquanto visitávamos a quinta fomos imaginando como teria sido o dia-a-dia das gerações que por aqui passaram: os passeios no jardim, as festas, as alegrias e tristezas daqueles que tiveram a sorte de poder habitar um espaço tão bonito. É realmente uma pena ver uma propriedade como esta assim tão degradada!


Cobra-de-água-de-colar

Durante uma das sessões de pesquisa de animais aquáticos, enquanto nos dirigíamos através de um prado húmido para uma zona em que se formaram alguns charcos temporários, tivemos a sorte de encontrar uma cobra-de-água-de-colar (Natrix natrix). Como é fácil de imaginar a excitação no grupo foi enorme, afinal era a primeira vez que os participantes puderam observar de perto uma cobra, animal com tão má fama e que desperta tantos medos entre a generalidade das pessoas.

Cobra-de-água-de-colar (Natrix natrix). Exemplar observado durante a saída de campo.

A cobra-de-água-de-colar é uma espécie inofensiva para o Homem. Tal como a maioria das espécies de serpentes que surgem em Portugal, esta espécie é aglifa (não possui dentes inoculadores de veneno).  As espécies opistoglifas, cobra-rateira (Malpolon monspessulanus) e cobra-de-capuz (Macroprotodun cucullatus) têm dentes inoculadores de veneno situados na região posterior do maxilar superior - no fundo da boca -, tornando muito pouco provável uma mordedura venenosa. Não apresentam perigosidade para o Homem. Somente a Víbora-cornuda (Vipera latastei) e a víbora-de-Seone (Vipera seoanei) são espécies potencialmente perigosas. Tratam-se de espécies solenoglifas (espécies que apresentam colmilhos, dentes inoculadores muito especializados situados na região anterior do maxilar superior).

Aparelhos inoculadores das serpentes.

 A cobra-de-água-de-colar é uma espécie que desenvolve a sua atividade tanto em meio aquático como em meio terrestre. É ágil, veloz e excelente nadadora. Deve o seu nome a um anel de cor branca ou amarela, a seguir à cabeça, que aparece na fase juvenil e depois vai-se esbatendo até desaparecer completamente. No exemplar que observámos este anel já era pouco visível.

Embora não venenosa e pouco agressiva, os elementos da equipa não lhe pegaram. Limitaram a tocar o seu corpo, fazendo-lhe carícias. Puderam observar atentamente as suas características, nomeadamente as escamas, os olhos - com pupila redonda -, e a língua bífida que nas cobras é um órgão olfativo.

Experiência única de tocar uma cobra, um animal tão mal afamado.
Observação das escamas epidérmicas.
Ninguém ficou de fora, todos quiseram experimentar a sensação de acariciar o animal. 


No final, lá deixámos a nossa amiga ir à vida dela. Com certeza apanhou um susto maior que o dos jovens investigadores!

No final, a cobra-de-água-de-colar foi devolvida ao seu meio.



Bilhete de identidade da cobra-de-água-de-colar:

 Nome científico: Natrix natrix;

 Filo: cordados;

Classe: répteis;

Comprimento: 100 - 120 cm (pode chegar aos 200 cm);

Habitat: bosques, prados e zonas agrícolas junto a cursos de água, charcos ou lagoas;

Dimorfismo sexual: pouco evidente,  as fêmeas atingem um maior comprimento; 

Alimentação: invertebrados, anfíbios e peixes. Ocasionalmente pode também alimentar-se de pequenos mamíferos e répteis;

Distribuição:  Europa, norte de África e Ásia ocidental.



Identificação das espécies capturadas

Depois de capturados, os animais foram identificados pelos elementos das três equipas. Esta fase do trabalho implicou uma cuidada observação das suas características, pois só assim foi possível concluírem a que espécies pertenciam.

Observação de um tritão adulto.

Observação das brânquias externas de uma larva de tritão.

Fase de identificação das espécies capturadas.


Como foi já referido, a identificação dos animais foi realizada através de guias de campo. Esta fase do trabalho implicou discussão entre os grupos a fim de se chegar a um consenso final sobre a espécie a que cada um pertencia. Embora realizado em autonomia, este processo foi devidamente supervisionado.

Utilização de guias de campo para a identificação das espécies capturadas.

A identificação dos animais é um trabalho por vezes complexo, algumas das espécies diferem em pequenos pormenores.


No final do trabalho, os elementos do clube, depois de pegarem cuidadosamente nalguns dos animais e lhes fazerem carícias, devolveram todos ao seu meio natural.

Manipulação cuidadosa de tritões adultos.

Libertação dos animais estudados. 

Devolução ao meio dos animais em que não era conveniente a sua manipulação.


No final deste projeto, estudo de espécies aquáticas da região envolvente da Ribeira de Canelas, foram as seguintes as espécies identificadas:

- Tritão-de-ventre-laranja (Triturus boscai)  [Ver aqui]
- Tritão-palmado (Triturus helveticus)
- Rã-verde (Rana perezi)  [Ver aqui]
- Cobra-de-água-colar (Natrix natrix)
- Escorpião-de-água (Nepa cinerea)  [Ver aqui]
- Escaravelho-aquático (Gyrinus substriatus)


Nota: algumas das espécies foram já referidas no site, basta clicar no link para visualizar; as que não tinham sido ainda identificadas serão alvo de publicação posterior.



De volta ao campo

Abril: tempo de chuva, tempo de anfíbios.

É sabido que o tempo húmido é o ideal para se observar anfíbios. O mês de abril trouxe finalmente chuva em abundância. Pequenas linhas de água que alimentam a Ribeira de Canelas engrossaram os seus caudais. Surgiram, também, alguns charcos temporários na região envolvente da Ribeira. Não podíamos perder esta a oportunidade para investigar espécies aquáticas.

Região envolvente da Ribeira de Canelas onde realizámos o trabalho de campo.  



Para realizarmos o trabalho de pesquisa usámos redes. Estas permitiram a captura das espécies aquáticas. Os animais foram colocados em frascos de vidro. Em alguns casos as espécies tiveram que ser separadas em frascos diferentes para se evitar predação e morte entre os animais capturados.

Prospeção de espécies aquáticas num charco temporário.



Captura de larvas de tritão.


Pesquisa de animais aquáticos em linha de água afluente da Ribeira de Canelas.


Observação de animais aquáticos num pequeno curso de água.



Dia de Clube, dia de boa disposição e aventura! 

A fase seguinte do trabalho consistiu em identificar as espécies capturadas. Bom, mas isso ficará para uma próxima ocasião!



Gavião

O gavião (Accipiter nisus) foi uma das espécies menos comuns que identificámos este ano, nunca antes tinha sido avistado na região. Esta pequena ave de rapina fez a sua aparição em três das nossas saídas durante os meses de inverno. Tratou-se provavelmente do mesmo indivíduo, um macho invernante (visitante de inverno) de passagem por Canelas.

Gavião (Accipiter nisus). Imagem daqui.

O gavião é uma ave de rapina tipicamente de bosques e florestas. Especializou-se em perseguir pequenas aves voando habilmente por entre árvores e folhagem por vezes densa.
Queres ver como é? então clica aqui para veres um vídeo.

Existe um acentuado dimorfismo sexual nesta espécie, o macho é bastante menor que a fêmea e apresenta listas avermelhadas no peito ao contrário da fêmea que apresenta o peito listrado de cinzento.

A observação de uma ave tão pouco comum provocou grande excitação nos elementos das equipas que a puderam acompanhar por um bom par de minutos através dos seus binóculos sobrevoando os pinhais da Serra de Canelas.

Observação de um gavião na região da Trilha da Serra de Canelas.


Uma vez na escola, as equipas pesquisaram informações sobre a espécie e registaram-nas nos seus cadernos de campo.

Fase de pesquisa de informação sobre o gavião (Accipiter nisus).

Colagem da estampa referente à espécie no caderno de campo.

Registo da observação de um gavião. Caderno de campo da Paula do 6ºI.



Bilhete de identidade do gavião:

Nome científico: Accipiter nisus

Filo: cordados

Classe: aves

Comprimento: 28 - 38 cm

Habitat: florestas e bosques, campos marginais de bosques e charnecas.

Dimorfismo sexual: o macho é menor que a fêmea e apresenta um tom arruivado no peito. A fêmea é listrada de cinzento na parte inferior.

Alimentação: pequenas aves (carnívoro).

Tipo de ocorrência: visitante de inverno (de passagem).

Frequência: raro.

Bico-de-lacre

O Bico-de-lacre, Estrilda astrild, é uma espécie originária do continente africano. Em Portugal, começou a ser observada em liberdade no ano de 1964 (na região de Caldas da Rainha) devido principalmente a fugas de cativeiro (a espécie ainda hoje é vendida como ave de gaiola). Dado que encontrou no nosso país condições ambientais favoráveis, expandiu-se rapidamente pelo território nacional.


Bico-de-lacre (Estrilda astrild) fotografado na região da Trilha.



Expansão do bico-de-lacre em Portugal Continental até 1999.


Foram já várias as ocasiões em que nos cruzámos com estas pequenas aves. Acontece, porém, que numa das últimas saídas tivemos a oportunidade de observar bem de perto um ruidoso bando durante uns bons dez minutos.

Queres relembrar o som característico do bico-de-lacre? Ouve-o aqui.

Podes ver também este pequeno vídeo:






A observação, bem como algumas informações pesquisadas posteriormente sobre a biologia da espécie, foram registadas, como é habitual, nos cadernos de campo dos participantes.
Registo da observação de bicos-de-lacre. Caderno de campo da Alina do 6ºI.






Bilhete de identidade do bico-de-lacre:

Nome científico: Estrilda astrild

Filo: cordados

Classe: aves

Comprimento: cerca de 8 cm;

Habitat: zonas húmidas ou linhas de água com vegetação densa como caniçais e silvados em regiões de baixa altitude.

Dimorfismo sexual: o macho e a fêmea são muito parecidos, é difícil distingui-los quando estão em liberdade.

Alimentação: sementes de gramíneas (granívoro).

Tipo de ocorrência: espécie residente

Frequência: muito frequente

Nota: trata-se de uma espécie exótica (introduzida no nosso país).


De regresso à escola

Após algumas saídas ao campo chegou o momento das equipas ficarem na escola a fim de desenvolverem trabalhos de pesquisa e aprofundarem os conhecimentos sobre as espécies já identificadas.

Depois das saídas ao campo as equipas permaneceram na escola a fim de realizarem trabalho de pesquisa sobre as espécies observadas e atualizarem os seus cadernos de campo.  


O trabalho de pesquisa sobre as espécies observadas realiza-se a partir de diversos guias de campo e livros de divulgação científica.

Consulta de um guia de campo de aves.


A informação, depois de pesquisada por alguns dos elementos, é partilhada com o grupo.

Leitura de alguns dos aspetos mais relevantes sobre a biologia de uma das espécies observadas nas saídas de campo anteriores.

As principais conclusões, depois de devidamente discutidas, são registadas pelos elementos do clube nos seus cadernos de campo.

Fase de registo das conclusões nos cadernos de campo.


Às informações sobre cada espécie observada, os elementos do clube juntam uma imagem que recortam previamente e colam no caderno de campo. Desta forma vão construindo um pequeno guia de bolso pessoal.

Imagens utilizadas para ilustrar as informações registadas.


Após a colagem da imagem no caderno segue-se a fase de registo da informação.


Todo este trabalho é do agrado dos elementos das equipas que vêem os seus cadernos cada vez mais bonitos e interessantes, mas...
... A verdade é que estamos todos mortinhos por voltar ao campo!

Melro-preto

Uma das primeiras espécies a ser observada pelos elementos das três equipas do clube foi o melro-preto (Turdus merula). É fácil avistarmos estas belas aves alimentando-se no chão ou pousadas em pequenos arbustos ou silvados logo no início da Trilha.

Observação de melros-pretos alimentando-se no chão.

Melro-preto (Turdus merula). Macho adulto.

A identificação dos machos é muito fácil, nem é necessário o auxílio do guia de campo: ave preta de tamanho médio e bico alaranjado, não dá para confundir! Já as fêmeas e os juvenis, com a sua cor acastanhada e bico escuro, são mais difíceis de identificar.

Já nos habituamos a reconhecer os seus sinais característicos de aviso de perigo que ouvimos muitas vezes quando percorremos a parte da Trilha que atravessa campos abertos. Queres relembrar como é? Então clica aqui.

Os melros são aves geralmente apreciadas pelas pessoas por causa do seu canto, um dos mais belos que se podem ouvir nesta região do país. É devido a esta característica que infelizmente alguns vão parar a gaiolas!...
Podes ouvir aqui o seu canto inconfundível.



Bilhete de identidade do melro-preto:

Nome científico: Turdus merula

Filo: cordados

Classe: aves

Comprimento: 24 - 27 cm;

Habitat: Pequenos bosques, jardins, prados húmidos com silvados e arbustos.

Dimorfismo sexual: o macho adulto é preto e tem o bico amarelo alaranjado; a fêmea é de cor acastanhada tal como o bico.

Alimentação: insetos, vermes e bagas.

Tipo de ocorrência: espécie residente

Frequência: muito frequente


Primeiras saídas de campo...

As primeiras sessões do clube serviram para os novos elementos aprenderem algumas metodologias do trabalho de campo:


a) Utilização correta dos binóculos;

Aprendizagem da técnica de utilização dos binóculos. 


b) Aprendizagem do "saber estar" no campo - em silêncio, com auto-confiança e sem receios,  e sempre com os sentidos bem atentos;

Exploração de percursos.

As saídas de campo implicam alguma destreza na superação de obstáculos (inclinações do terreno, vegetação fechada,...). 


c) Desenvolvimento das técnicas e da capacidade de observação;

A prospeção de aves deve ser inicialmente realizada a olho nu. Só depois de as localizarmos é que devemos utilizar os binóculos para realizarmos uma observação cuidada e podermos identificá-las.    


c) Utilização de guias de campo para identificação estudo da biologia das espécies;
Os guias de identificação são essenciais em trabalhos de pesquisa no campo.




Com o tempo e a prática os nossos participantes não tardarão muito a tornarem-se uns VERDADEIROS NATURALISTAS!